"Em todo tempo ama o amigo, e na angústia se faz um irmão"
Quando voltei da viagem para o país atingido pelo terremoto meu mundo pareceu ter desabado. “ E agora que estou de volta?? O que vou fazer??” Era o que parecia ter ficado gravado na minha mente e nunca mais iria ser apagado. Tinha aberto mão do emprego que sempre sonhei durante minha graduação e agora não sabia o que faria ao voltar para meu próprio país.
Ao mesmo tempo, os supostos seguidores da mensagem me cansavam cada dia mais. Era tanta hipocrisia, tanto veneno destilado com sabor de mel para as pessoas, que eu não conseguia ligar a TV ou mesmo assistir a algumas pessoas teoricamente falando da mensagem.
O mundo, enfim, não me parecia um lugar tão agradável para morar. Mas eu tinha que continuar vivendo, eu tinha muita coisa ainda para fazer, por mais que eu não conseguisse enxergar o que deveriam ser essas coisas.
Um dia, ao sair para distribuir currículos, encontrei com Marcos, um antigo colega, que também era seguidor da mensagem.
M: Ei Lot! Quanto tempo! Fiquei sabendo que você foi para aquele país do terremoto, é verdade?
L: Fui sim, como ficou sabendo?
M: Uma amiga minha chegou a pensar em ir, mas infelizmente ela tinha conseguido um excelente emprego e tinha acabado de começar, então não quis ir. Mas ela ficou sabendo que você ia, e me contou.
Eu fiquei em silêncio por alguns instantes, porque imaginei o quanto eu estaria melhor se não tivesse largado o meu próprio emprego perfeito, mas Marcos interrompeu meus pensamentos.
M: Mas eu disse para ela que você tinha chegado a comentar uma vez que tinha conseguido o emprego dos sonhos e provavelmente abriu mão dele para ir para lá. E foi exatamente isso que aconteceu não foi?
L: (suspiro) Foi.
M: Que bom te encontrar então Lot, estava indo nessa agência de emprego aqui perto, para buscar alguns currículos para uma vaga que surgiu na empresa do meu pai. E como sei que é na sua área, pensei que você poderia estar interessado.
L: Eu...eu estou muito interessado!
M: Então vamos comigo na empresa, que eu entrego seu currículo pessoalmente e te apresento, é até melhor.
L: Ok. (minha surpresa era tão grande que não conseguia sair de respostas monossilábicas).
Sempre fui um bom colega de Marcos e sempre ficamos sabendo das grandes notícias da vida um do outro, mas nunca parei para conversar de verdade com ele. No caminho para a empresa do pai dele, José, fiquei sabendo que eles tinham perdido tudo para um pseudo-seguidor da mensagem, que disse que toda a ajuda da empresa iria para uma obra social, mas na verdade ficou com todo o dinheiro e fugiu do país. Eles tiveram que recomeçar do zero e eu seria o primeiro funcionário contratado desde então, porque ele resolveu trabalhar em outro seguimento, onde meu trabalho poderia ser de grande utilidade. Quando cheguei fiz uma breve entrevista, sem nenhuma aparência de entrevista na verdade, e fui admitido.
Ao chegar em casa minha mãe disse para mim que sabia que eu não voltaria para casa desempregado, que eu estava com a fé surpreendentemente pequena para quem fazia coisas tão malucas como as que eu fazia. E disse para mim algo que nunca vou esquecer:
- É preciso mais fé para encarar o cotidiano do que para encarar os grandes desafios.
No dia seguinte, um sábado, Marcos me chamou para almoçar com sua família, e nós dois saímos para comprar algumas coisas para um churrasco.
M: Sabe de uma coisa Lot, meu pai, que é seguidor da mensagem, tinha prometido para ele mesmo que nunca mais iria contratar alguém que dissesse ser seguidor da mensagem. Mas resolveu contratar você, porque ele sabia que você era de fato seguidor dela.
L: Eu me sinto honrado, de verdade, mas você me conhece um pouco Marcos, eu não sou o super-herói que muitos imaginam que eu sou.
M: É exatamente por isso que ele te contratou.
Ao ver um ponto de interrogação gigante estampado em meu rosto, Marcos se justificou:
M: O cara que deu o golpe nele tinha tanta pinta de perfeito que meu pai nem desconfiou, sempre vivia falando em coisas boas, em como o Autor queria nos ver bem e sempre financeiramente esbanjando coisas, que meu pai nunca desconfiou. Eu nunca fui fã do cara porque ele dizia algo que eu nunca concordei, que é essa coisa de felicidade sempre na terra para os filhos do Autor. Eu sei que a vida tem momentos difíceis, e não é por isso que ela não é perfeita.
L: Posso dizer uma coisa?
M: Claro!
L: Estou cansado dos seguidores da mensagem, ou melhor estava. Estava cansado de ver que todos estão indo pelo caminho mais fácil quando O caminho na verdade é muito difícil. E fico tentando provar o contrário para meu amigo André, mas fica cada dia mais difícil.
M: Sabe, uma coisa que aprendi nesse período em que mal mal tínhamos dinheiro para comer, foi que esses caras também, por mais difícil que seja engolir isso, eles também são seres humanos que erram como nós. A mentira que eles pregam deve ser combatida veementemente, e se eles levarem isso para o lado pessoal, como é usual eles fazerem, o problema não é nosso, mas não podemos nos achar como as únicas pessoas fiéis à verdade na terra, porque senão cairemos no erro do orgulho e estaremos no mesmo patamar que eles. Temos que pedir ao Autor para livrar as pessoas das mentiras deles, e temos que pedir que eles mesmos sigam a verdade.
L: Mas essas pessoas dizem seguir a verdade, elas conhecem a verdade, e a distorcem para puro lixo, desviando as pessoas da verdade e levando-as ao caminho oposto do caminho.
M: Eu sei. Concordo. E pode ser que nem mesmo o próprio Autor tenha misericórdia deles no futuro, mas quem vai fazer esse julgamento é Ele. Devemos combater a mentira que eles pregam sem ofendê-los, sem parecer contra eles. Quem separa o joio do trigo é só Ele.
L: Verdade. Marcos, obrigado!
M: Porque?
L: Pelo emprego, pelo churrasco e pela sua amizade.
M: É muito bom saber que posso ser seu amigo Lot.
Era isso então, finalmente um amigo em meio a esse mundo confuso e que parecia estar virado ao avesso. Quem sabe um dia dois amigos se tornariam três, depois cinco, seis, sete, dez, até o dia em que a verdade seja dita e a mentira desmascarada?
Podia ser só um sonho, mas eu preferia acreditar nele já que me dava forças para seguir em frente.
Fonte da imagem: www.ghizoni.art.br